Como voto de Fux no plano de golpe pode afetar relação com ministros do STF
Em parecer que durou quase 14 horas, magistrado votou para absolver o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros cinco réus
Gabriela Piva, da CNN, São Paulo11/09/25 às 14:06 | Atualizado 11/09/25 às 22:15

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O ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal), votou na quarta-feira (10) para absolver o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros cinco réus por crimes contra a democracia.
A previsão era de que a sessão do julgamento envolvendo o ex-mandatário, que começou às 9h, fosse concluída às 12h. No entanto, ela só se encerrou próximo das 23h.
Durante seu voto, Fux também votou para absolver por completo o ex-comandante da Marinha Almir Garnier; o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência); Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; o general Augusto Heleno, ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional); e Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.Play Video
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Já o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e o general Walter Braga Netto foram condenados pelo crime de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.
Fux ainda votou pela nulidade de todo o processo por entender que o STF não é a instância competente para analisar a ação. Mesmo assim, afirmou que, o caso estando no Supremo, o julgamento deveria ocorrer no plenário da Corte, que conta com 11 ministros, e não na Primeira Turma, formada por cinco.
Na denúncia da PGR, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, considera que todos os atos que resultaram na depredação das sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023, devem ser examinados em conjunto.
O julgamento da trama golpista ocorre na Primeira Turma do Supremo porque o processo (Ação Penal 2668) está sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes, que é integrante do colegiado. Logo, o processo é direcionado automaticamente à turma do relator.
Os réus são acusados de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado contra o patrimônio público da União e deterioração de patrimônio tombado.
Voto afeta relações de Fux no Supremo?
No voto, Fux discordou de Alexandre de Moraes e do ministro Flávio Dino, que votaram pela condenação de Bolsonaro e os outros sete réus pela trama golpista na terça-feira (9).
À CNN, o professor de Direito Constitucional da FGV Rubens Glezer disse que divergência de Fux é esperada no STF, mas ressaltou a maneira como ocorreu essa distinção entre ele e seus pares.
“Tem algo muito peculiar nesse voto: nos termos, no conteúdo, no modo como ele foi proferido, no modo como ele foi conduzido, que indica algo de anormal e de fora da regularidade”, afirmou. “[A divergência] Se dá com vários elementos de estranhamento. O primeiro estranhamento aparece já nas votações preliminares, no modo como ele trata as regras estabelecidas no Tribunal, que ele já seguiu, sobre possibilidade de julgamento e de recurso”.
Já o advogado criminalista Rafael Paiva disse ser “evidente” a diferença entre Fux e os outros ministros, mas ressalta: “O voto divergente do Fux não deveria, em nenhum sentido, atrapalhar, ou ser uma questão, dentro do STF, já que cada um dos ministros têm seu livre convencimento”, disse à reportagem.
Durante o parecer na quarta-feira, Fux questionou decisões do STF anteriores ao julgamento da ação. O professor da FGV relembrou quando a instituição decidia se acataria, ou não, a denúncia da PGR. Na ocasião, Fux apontou a incompetência da instituição para julgar a trama golpista, mas votou a favor do recebimento.
“[Fux] Pega essas questões, que estão absolutamente consolidadas e, não só apresenta a discordância, mas tenta desmoralizar a construção delas. Ele está, no limite, não só marcando uma posição divergente, mas questionando a autoridade do Tribunal na tomada dessas decisões, questionando a legitimidade delas. Então, é uma crítica de um nível muito mais profundo”, completou Glezer.
Para Gustavo Sampaio, professor de Direito Constitucional da UFF, Fux teve acertos técnicos, apesar de polêmicos. Segundo ele, o ministro teve razão ao afirmar que o plenário era quem deveria julgar a ação penal.
Para explicar isso, ele disse que, até dezembro de 2023, as autoridades com prerrogativa de foro no STF eram julgadas no plenário, mas que o regime foi alterado no final daquele ano. A competência para julgar essas autoridades, então, passou para as turmas do STF.
“Exceto o presidente da República, o presidente da Câmera dos Deputados, o presidente do Senado, os 11 ministros do Supremo e o procurador-geral da República que permaneceram a ser julgados no plenário”, ressaltou Sampaio.
O STF entendeu que Bolsonaro poderia ser julgado pela Primeira Turma por não ser mais presidente, explicou Sampaio.
“Fux observou que, como ex-presidente, Bolsonaro só está julgado no Supremo porque é acusado da prática de crime enquanto era presidente. Então, se o que atraiu a competência do Tribunal foi a condição dele de presidente, ele deveria ser julgado pelo plenário”, disse.
O professor da UFF também destacou que a extensão analítica do voto “incomodou” outros ministros.
“[O tempo para votar] Pode, inclusive, não ter sido delicado com outros ministros. Talvez tivesse sido de bom alvitre que ele interrompesse a leitura e pedisse ao presidente da turma para continuar no dia seguinte, porque ele acabou gerando, inclusive, a necessidade de se postergar, de 9h para às 14h, o início da sessão de hoje por conta do cansaço imposto aos demais ministros da casa”, pontuou.
Para Glezer, as quase 14 horas de parecer, assim como o modo como Fux proferiu os votos, também pode ter gerado um incômodo entre os magistrados. O professor ainda disse que o ministro falou com “uma certa agressividade” e negou “a existência de fatos que nem a defesa negou”.
“Imagino que [o voto do Fux] também estabeleça uma certa ruptura e quebra de confiança”, disse Glezer.
Sampaio também destacou a postura negacionista de Fux com relação à tentativa de golpe de Estado no Brasil, apesar de ressaltar o acerto do ministro ao julgar réu por réu.
“O ministro Luiz Fux nega a ocorrência de um fato que, de maneira inquestionável, parece ter ocorrido, que foi a tentativa de interrupção do processo democrático no Brasil [no final de 2022 e início de 2023]”, completou.
Isso gerou muita dissidência entre os ministros, mas não vai gerar nenhum problema de relacionamento do ministro Fux com os demais ministros da Corte. Isso não acontece. É uma impressão que fica na opinião pública, mas que não condiz com a realidade dos fatos. Na verdade, há por dentro, nas achegas do poder, dentro dos convescotes e reuniões, todos se entendem. Todos compreendem que a independência funcional permite que cada um decida da forma que entender mais prudente à luz da interpretação dos fatos e do Direito.
































































































